Desde que eu
me entendo por gente eu gosto de ser “a mais”. Não sei exatamente como
explicar, mas eu sempre tive essa necessidade de estar ou na extremidade boa ou
na extremidade ruim de algo. Nunca gostei de estar no meio. Exemplo: lembro uma
vez na escola, devia ser sétima série, e discutíamos onde todo mundo da sala
morava. E eu morava longe da escola – uma das meninas morava na esquina do
lado, enquanto duas moravam no bairro vizinho. Eu nunca seria a pessoa a morar
mais próxima a escola. Fiz questão de provar – mesmo que hoje eu tenha de
admitir que não era verdade – que eu era a que morava mais longe. Nunca soube
porque e nem sei porque isso me contenta, mas eu sempre fui assim.
Mas aí eu to
dentro do feminismo, seguindo páginas feministas, com amigas feministas, e a
galera grita por sororidade e não julgar umas as outras e isso é incrível, até
que... até que chegam aquelas pessoas um pouco mais... hum... agressivas? E essas pessoas colocam sua causa acima das
outras, e o mesmo ocorre no sentido contrário e eu, mesmo que sendo uma pessoa
que naturalmente busca essa “rivalidade”, não consigo entender.
Tinha um
sitcom do Matthew Perry (Friends) chamado “Go On” que teve uma temporada de
2012 a 2013 que era de um grupo de pessoas num grupo de terapia por conta de
alguma perda. O personagem principal, do Matthew, havia perdido a esposa em um
acidente de carro. Uma das mulheres do grupo perdeu a esposa para uma doença.
Mas havia também uma personagem que tinha perdido... seu gato. E uma das regras
da terapeuta do grupo era: nunca comparem suas perdas. Em um dos episódios o
principal resolve que isso é bobagem e enquanto a terapeuta não está faz um
joguinho de “qual a pior tragédia”. Quem ganha, pelas regras do jogo, é a que
perdeu o gato. Contra a mulher que tem dois filhos e perdeu a esposa. E isso
gera uma discussão no grupo até que a terapeuta aparece e explica que é por
isso que eles não devem comparar. Independente do tamanho e impacto da perda,
todo mundo ali tem um passado triste e todos eles têm direito de sofrer, sem se
sentirem mal por não serem os únicos a sofrer.
E às vezes eu
sinto que falta muito disso no “mundo dos oprimidos”.
Uma mulher
hétero sobre um tipo de opressão que um homem gay nunca vai entender.
Mas da mesma
forma esse homem gay sofre uma opressão que uma mulher nunca vai entender.
E ficar
colocando esses interesse próprios – minha opressão sobre a sua – diretamente
contra os interesses dos outros é um tiro no pé. Enquanto a dor de um oprimido
for maior que a de outro e não de igual importância (apesar de ser diferente),
estaremos colocando mais obstáculos no caminho em direção a igualdade.
Não estou
falando em protagonizar um movimento do qual você não é o principal interessado.
Não quero que mulheres brancas liderem um movimento negro. Mas a gente precisa
aceitar que apesar das diferenças, todos sofremos. Todos somos oprimidos por
este sistema que tem muitos pés para nos esmagar e que sozinhos somos vítimas
muito mais acessíveis.
Não vamos
comparar nossos sofrimentos.Vamos fortalecer nossa voz lutando por nós. Você,
mulher branca, que sofre machismo, mas não racismo. Use seu papel parcialmente
privilegiado na sociedade como algo para dividir com sua amiga negra. Dê voz a
ela onde você não pode falar e aceite o que ela tem a dizer. Nunca a oprima da
maneira que você não quer que um homem te oprima. Você, homem gay, entenda a
maneira que o hétero te oprime e use isso para enxergar como você pode estar
oprimindo uma mulher.
Jamais seja
um opressor. Jamais.
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