quarta-feira, 11 de março de 2015

Sobre violência e justiça com as próprias mãos

Olha. Eu comecei esse texto três vezes. Todas as outras três tentativas estão arquivadas pra eu tentar dar uma alterada depois, porque eu acho que o assunto que eu quero tratar aqui puxa tanto outros que fica difícil seguir uma única linha de raciocínio. Apesar de eu querer MUITO conectar todos esses pontos pra tentar fazer as pessoas entenderem. Mas acho que não vai dar.

Enfim. O que eu vou escrever aqui vai surpreender muitas pessoas, eu sei. Mas eu preciso escrever. Porque eu preciso que as pessoas finalmente entendam minha posição e os motivos por trás do que eu acredito. Então, só pra já introduzir o assunto principal logo de cara, eu quero falar sobre uma crença minha, que é:

Violência só gera violência.

É simples. Eu acho que violência nunca, jamais, em hipótese alguma, é justificada. Seja algo grave ou não. Violência não tem justificativa.

Ta circulando pela internet um vídeo de uma mãe que bateu no filho porque ele espalhou fotos – ou foi vídeo? Não sei – da namorada – ex? – na internet. Muita gente me marcou/enviou/comentou comigo. Vieram me mostrar tipo “olha que legal!!!”. Além dos que me mandaram, muitos amigos compartilharam. Não sei o que me surpreendeu mais: amigxs (usando o x pq realmente ñ quero que soe como se tivessem sido primariamente homens ou mulheres em nenhum dos grupos) não feministas – e que nunca vi se expressarem contra o revenge porn ou semelhantes – compartilhando e dizendo bem feito, ou xs feministas compartilhando e dizendo a mesma coisa.

O menino é um babaca. Nem vi o vídeo – nem pretendo, na verdade -, mas eu sei que ele é um babaca, porque todo ser humano com uma mentalidade dessa é. Mas isso não quer dizer que ele “mereça apanhar”. Ninguém “merece apanhar”. Na verdade, mesmo que na concepção de vocês mereça... quem é você pra decidir quem merece ou não? Por que o seu julgamento é superior e você pode decidir ou não quando uma pessoa – seja lá o que tenha feito – mereça apanhar? Ou sofrer ou sei lá.

Dica: ninguém. Você não é absolutamente ninguém pra decidir isso.

É como aquele caso que fez certo sucesso da mulher que foi estuprada e “castrou” seu estuprador. O cara a estuprou. Ele é um ser escroto e horrível que precisa receber punição pelos seus atos. Que precisa, acima de tudo, entender que o que ele fez é errado e porquê. Mas, mesmo esse cara tendo errado – cometido um crime horrível que jamais poderá ser desfeito – o ser humano tem que entender que justiça com as próprias mãos não funciona. Essa mulher que foi estuprada foi uma vítima que de maneira alguma merecia o que aconteceu com ela. Mas e se ela tivesse feito algo horrível no passado e usassem o estupro como justificativa de justiça? Estaria certo? Não. São duas faces da mesma moeda.

Voltando pro cara que espalhou as coisas da namorada. E se essa namorada tivesse exposto coisas dele antes? Seria justificável a ação dele? NÃO. Mas como você, que achou bem feito ele apanhar, poderia me dizer que não achou bem feito o que aconteceu com ela? Porque um é justificável e o outro não?

Vou bater na tecla de novo: nada no mundo justifica a ação desses dois caras que eu citei (foram dois caras por coincidência, talvez por eu ter usado crimes machistas, mas poderia facilmente ser uma mulher aqui).Eles cometeram um crime – cada um a seu nível - e ambos merecem pagar. Mas a justiça está aí pra isso. Ela está errada? Ok. Então vamos lutar por uma justiça melhor. Por um sistema penal que aprisiona criminosos e reabilita eles e faz com que essa reabilitação seja baseada em trabalho que beneficie a sociedade. Mas nós – como indivíduos – não podemos decidir qual a melhor punição.

Não queria entrar no mérito, mas preciso: isso cai perfeitamente nos “justiceiros” que não aguentam esperar decisão do governo e vão “resolver” as próprias injustiças. Sabe o problema disso? O limite das pessoas. E o fato de que o conceito de justiça não é único. A gente começa permitindo que um cara mate um criminoso que matou sua esposa. Daí o outro cara que já é mais “pavio curto” acha que matar um sequestrador é perfeitamente aceitável. Aí já chega o outro cara que acha que matar um ladrão também é aceitável. E nisso a gente vai descendo até aquela pessoa que dentro dos próprios moldes de justiça acha que é correto matar quem olhou feio pra ele na rua.

Você pode dizer que jamais faria isso, mas você não pode decidir pelos outros, não pode pensar pelos outros. E as pessoas tem conceitos que muitas vezes precisam ser barrados.

Antes do mimimi de “você tava falando de violência (tapas) e do nada mudou pra morte, não é bem assim”. É bem assim SIM! Não é bem assim pra você, mas como você acha que é a cabeça de um marido que mata a mulher porque tem ciúmes? Ela é exatamente assim. Começa com um empurrão, vira um tapa, que vira um soco, que de repente virou uma faca cravada vinte e cinco vezes na vítima.

Olha, eu não quero ser hipócrita aqui. A gente vê alguns casos que fazem a gente pensar “uma pessoa dessa merece morrer”. Mas há uma enorme diferença entre pensar e agir. Eu, por exemplo, jamais agiria num impulso desse. Tem gente que agiria. Mas a questão é que não importa que esse pensamento existe, porque a gente não é a justiça e nem deus e nem o destino ou seja lá o que diabos você queira colocar aqui pra decidir.

Sabem o Batman? É, o homem morcego, herói da DC e tals. Vou confessar que não muito fã dele. Toda essa persona fechada e amargurada me da vontade de me largar numa cadeira e implorar pelo amor de deus não. Mas o cara é um herói famosíssimo que praticamente o mundo inteiro gosta. E sabe um dos princípios dele?

Heróis não matam. Heróis apreendem e mandam pra prisão. Essa é a função deles, é assim que eles fazem do mundo um lugar melhor.

Olha, eu posso não gostar do cara. Mas é o Batman e ele não concorda com esse tipo de justiça – vingança.

Talvez esteja na hora de repensar os seus conceitos.


* Próximo texto da saga de violência/justiça com as próprias mãos será sobre Jason Todd e a repercussão disso no universo DC. Stay tuned.

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